A dor orofacial afeta mais de 25% da população mundial, sendo mais prevalente em mulheres. Com o objetivo de entender melhor as diferenças sexuais no tratamento dessa condição, a pesquisadora Sacha Aubrey conduz estudos inovadores sobre o efeito antinociceptivo da metformina. O Portal Ciência teve a oportunidade de conversar com Sacha para entender os avanços e as implicações de sua pesquisa.
Portal Ciência: Para que nossos leitores entendam melhor, você poderia explicar de forma simples qual é a proposta da sua pesquisa sobre as diferenças sexuais no efeito antinociceptivo da metformina em dor orofacial?
Sacha Aubrey: Claro! Nosso estudo busca entender se a metformina, um medicamento amplamente utilizado para tratar diabetes, tem efeitos diferentes no alívio da dor facial entre homens e mulheres. Especificamente, queremos saber se há diferenças na maneira como homens e mulheres respondem à metformina no tratamento da dor orofacial, que é a dor na região da face, cabeça e boca. Compreender essas diferenças pode nos ajudar a desenvolver tratamentos mais eficazes e personalizados para cada sexo.
Portal Ciência: Quais foram os principais métodos utilizados no estudo para testar a eficácia da metformina no alívio da dor orofacial? Como vocês trabalharam com os canais TRP durante o processo?
Sacha Aubrey: Utilizamos vários métodos pré-clínicos para avaliar a eficácia da metformina. Realizamos testes farmacológicos em modelos de dor orofacial aguda e crônica, utilizando agonistas e antagonistas dos canais TRP, que são importantes na percepção da dor. Também fizemos experimentos de docking molecular para analisar como a metformina interage com os receptores TRPV1 e TRPA1. Além disso, estudamos a expressão gênica para verificar se a metformina pode reduzir a produção do receptor de dor TRPV1 no DNA.
Portal Ciência: Poderia explicar como a metformina atua nos canais de receptor transitório (TRP) e por que esses canais são importantes na percepção da dor?
Sacha Aubrey: A metformina atua possivelmente como um antagonista dos canais TRPV1 e TRPA1, que são cruciais na transdução de estímulos sensoriais relacionados à dor. Bloquear esses canais pode reduzir a sensação de dor, tornando a metformina uma potencial abordagem terapêutica para distúrbios dolorosos.
Portal Ciência: Quais foram as principais descobertas em termos das diferenças entre machos e fêmeas? Como os hormônios sexuais influenciam essas respostas ao tratamento com metformina?
Sacha Aubrey: Descobrimos que a metformina reduziu a dor aguda em ambos os sexos, mas foi mais eficaz na dor crônica em fêmeas. Isso sugere que os hormônios sexuais, como o estrogênio, podem influenciar a resposta ao tratamento, abrindo caminho para terapias mais personalizadas.
Portal Ciência: Vocês esperavam essas diferenças entre sexos ou houve surpresas nos resultados?
Sacha Aubrey: Fiquei surpresa ao observar que, na dor crônica, a resposta foi melhor nas fêmeas do que nos machos. Realizamos um teste crônico de 21 dias, e nas fêmeas a metformina apresentou um efeito mais rápido e eficaz em comparação aos machos.
Portal Ciência: Como você vê a aplicação prática desses resultados no desenvolvimento de tratamentos mais personalizados para dores crônicas?
Sacha Aubrey: Esses resultados indicam que podemos ajustar dosagens e tempos de tratamento com base no sexo do paciente. Mulheres, por exemplo, podem se beneficiar de doses menores e tratamentos mais rápidos, enquanto homens podem precisar de ajustes específicos para alcançar resultados semelhantes. Além disso, como a metformina é um medicamento acessível, isso oferece uma solução viável economicamente para sistemas de saúde pública, beneficiando um grande número de pacientes.
Portal Ciência: Há expectativas de que esses achados possam levar a novos ensaios clínicos ou medicamentos baseados nas descobertas com a metformina?
Sacha Aubrey: Sim, o reposicionamento de fármacos como a metformina é uma estratégia promissora. Como a metformina já é amplamente utilizada e possui um perfil de segurança bem estabelecido, podemos acelerar os ensaios clínicos para aprovar seu uso no tratamento da dor orofacial, reduzindo custos e tempo de desenvolvimento.
Portal Ciência: Qual a importância dessa pesquisa para a sociedade, especialmente para pacientes que sofrem de dores crônicas ou orofaciais? Como os tratamentos podem melhorar com base nesses resultado
Sacha Aubrey: Nossa pesquisa pode levar a tratamentos mais eficazes e acessíveis para a dor orofacial, melhorando a qualidade de vida de milhões de pessoas. Além disso, ao entender as diferenças sexuais na percepção da dor, podemos desenvolver terapias mais personalizadas, beneficiando especialmente as mulheres que são mais afetadas por essa condição. A metformina, já sendo um medicamento bem estabelecido, facilita a implementação desses novos tratamentos, tornando-os mais rápidos e econômicos para a população.
Sobre a pesquisadora
Sacha Aubrey possui graduação em Farmácia pela Universidade de Fortaleza (UNIFOR) e atualmente é doutoranda em Biotecnologia pela Rede Nordeste de Biotecnologia (RENORBIO). Ela é membro do Grupo de Pesquisa Farmacologia de Produtos Naturais e Sintéticos da Universidade de Fortaleza, onde desenvolve sua expertise na área de Farmacologia de Produtos Naturais e Sintéticos.
Sua pesquisa é focada na Farmacologia da dor orofacial em roedores e no uso de Zebrafish (Danio rerio) como método alternativo ao uso de roedores, contribuindo para avanços no tratamento e manejo da dor.