Os avanços em tratamentos médicos têm sido impulsionados por tecnologias como nanotecnologia, biotecnologia e inteligência artificial, que prometem revolucionar a forma como fármacos são administrados. Nesse contexto, sistemas inovadores de liberação de fármacos surgem como soluções capazes de otimizar tratamentos, aumentar a eficácia e reduzir efeitos colaterais. Para entender melhor como esses sistemas podem transformar a saúde pública, o Portal Ciência conversou com Angelo Roncalli, pesquisador do NUBEX e professor do curso de Farmácia da Universidade de Fortaleza, instituição de ensino da Fundação Edson Queiroz.
Portal Ciência: Para começar, você poderia explicar, de forma simples, do que se trata a pesquisa “Sistemas inovadores para a liberação de fármacos”? Qual é o principal objetivo deste estudo?
Angelo Roncalli: A crescente demanda por tratamentos de doenças graves, o surgimento de novas pandemias e a redescoberta de usos terapêuticos para fármacos já estabelecidos têm impulsionado as empresas farmacêuticas a investir em novos medicamentos. Nesse contexto, o desenvolvimento de Sistemas Inovadores de Liberação de Fármacos torna-se essencial, ao oferecer alternativas terapêuticas que visam otimizar as formas farmacêuticas, com o objetivo de aumentar a eficácia, reduzir efeitos colaterais e melhorar a adesão dos pacientes ao tratamento.
Portal Ciência: O que torna esses sistemas de liberação de fármacos inovadores? Quais são as principais diferenças em relação aos métodos convencionais?
Angelo Roncalli: Esses sistemas são inovadores porque atendem a uma necessidade que até então não era suprida pelas formas farmacêuticas convencionais. Por exemplo, as vacinas administradas por via nasal permitem a liberação de moléculas que atingem rapidamente a corrente sanguínea, estimulando as defesas do organismo. Já formas convencionais, como comprimidos administrados por via oral, não seriam capazes de transportar esse tipo de molécula, pois, ao entrar em contato com o suco gástrico, ela poderia ser degradada, perdendo assim sua eficácia.
Portal Ciência: Quais métodos e tecnologias estão sendo utilizados para desenvolver esses novos sistemas de liberação de fármacos?
Angelo Roncalli: A Nanotecnologia, a Biotecnologia e, mais recentemente, a Inteligência Artificial (IA) são ferramentas que permitiram abrir novas frentes nessa área. Elas possibilitaram o surgimento de novos biopolímeros com baixos índices de reações adversas, fármacos direcionados com alta seletividade a alvos específicos e menor intervalo de tempo entre a prototipação e o escalonamento do produto. Todos esses fatores contribuem para formas de administração que utilizam concentrações menores do fármaco, mantendo a atividade farmacológica.
Portal Ciência: Quais são as suas expectativas em relação aos resultados? Que tipo de impacto você espera que esses sistemas possam gerar no tratamento de doenças?
Angelo Roncalli: A crescente flexibilidade desses sistemas permite a veiculação de fármacos com propriedades distintas, além de oferecer vias alternativas de administração. Essas vantagens trarão benefícios tanto para pacientes que já estão em tratamento com formas convencionais quanto para aqueles com necessidades especiais que buscam tratamentos alternativos. Isso pode resultar em maior eficácia e menor tempo de tratamento.
Portal Ciência: Como esses novos sistemas de liberação de fármacos podem beneficiar a sociedade? Quais problemas atuais no tratamento de doenças eles podem ajudar a resolver?
Angelo Roncalli: A indústria farmacêutica enfrenta desafios com a diminuição do surgimento de novas moléculas com atividade farmacológica. Um reflexo disso é o aumento das pesquisas voltadas ao reposicionamento de fármacos. A pandemia de COVID-19 agravou esse cenário, especialmente em países em desenvolvimento, que apresentam alta dependência tecnológica e de matéria-prima. Nesse contexto, esses sistemas beneficiarão a sociedade ao promover maior independência tecnológica, agilidade e autonomia no desenvolvimento de medicamentos. Além disso, permitirão a veiculação de fármacos com alto potencial para o tratamento de doenças graves, aumentando a chance de cura. Isso será possível graças às tecnologias que otimizam a liberação dos fármacos no local de ação, tornando-os mais eficazes.
Portal Ciência: Como você enxerga o futuro dos tratamentos médicos com a aplicação desses sistemas inovadores de liberação de fármacos?
Angelo Roncalli: Como mencionei, a Nanotecnologia, a Biotecnologia e a Inteligência Artificial já se consolidaram como ferramentas poderosas no desenvolvimento de sistemas de liberação inovadores. Exemplos notáveis incluem o desenvolvimento da vacina contra a COVID-19 em tempo recorde, o uso de moléculas de RNA no tratamento do câncer e, mais recentemente, a criação de terapias personalizadas. Acredito que, em breve, essas terapias, que atualmente demandam alto investimento, alcançarão um número maior de pessoas, revolucionando os medicamentos e transformando a forma como os tratamentos são conduzidos.
Mais sobre o pesquisador
Angelo Roncalli Alves e Silva é farmacêutico graduado pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, com mestrado em Ciências Farmacêuticas pela Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho e doutorado pela Universidade de São Paulo. Atuou como pesquisador visitante na Pennsylvania State University e foi coordenador de pesquisa na Universidade de Fortaleza.
Atualmente, é colaborador da Universidade Federal do Ceará, professor assistente do curso de Farmácia e docente do Mestrado Profissional em Tecnologia e Inovação em Enfermagem da Universidade de Fortaleza. Especialista em produção de medicamentos e cosméticos, seus principais focos são sistemas de liberação controlada, nanopartículas, biomateriais e citotoxicidade. Também trabalha na captação e desenvolvimento de projetos de inovação conectando empresas e universidades.