A diversidade e inclusão nos ecossistemas empreendedores são temas centrais de uma pesquisa inovadora que busca compreender como grupos minorizados, como negros, mulheres, indígenas e LGBTQIAPN+, estão sendo inseridos – ou excluídos – desses espaços. O Portal Ciência conversou com a professora Keysa Mascena, do Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) da Universidade de Fortaleza, instituição de ensino da Fundação Edson Queiroz, para entender avanços e desafios dessa pesquisa e o impacto que ela pode gerar na sociedade.
Portal Ciência: Qual é o tema central da sua pesquisa e o que te motivou a estudá-lo?
Keysa Mascena: A pesquisa tem como tema central a diversidade e inclusão nos ecossistemas empreendedores. Buscamos entender como ocorre a inclusão ou exclusão de empreendedores minorizados, como negros, indígenas, mulheres, LGBTQIAPN+, pessoas com deficiência e grupos socioeconomicamente vulneráveis. Esse tema é urgente porque o ecossistema empreendedor precisa se tornar mais inclusivo. Minha motivação é tanto acadêmica quanto pessoal: sou uma mulher negra, da periferia, representando a intersecção de raça, gênero e classe no ambiente acadêmico. Uso minha experiência e minha pesquisa para promover os temas de diversidade, equidade e inclusão, conectando histórias de empreendedores e contribuindo para a construção de ecossistemas mais inclusivos.
Portal Ciência: Desde quando essa pesquisa está sendo realizada e como ela evoluiu desde o início?
Keysa Mascena: A pesquisa começou em 2023, com um foco inicial no empreendedorismo negro, dada a relevância e a urgência do tema do antirracismo em nossa sociedade. Desde então, realizamos entrevistas com empreendedores negros em diversos estados brasileiros, com a colaboração de duas mulheres negras que atuam no ecossistema de inovação, além de dois professores, um da USP e outro da UNIFOR. Recebemos financiamentos importantes do SemeAD Pq Jr, do CNPq e da UNIFOR, que viabilizaram o desenvolvimento dos projetos. Esses esforços resultaram em artigos em andamento, apresentações em eventos acadêmicos e discussões na mídia sobre o tema.
Portal Ciência: Quais teorias ou estudos influenciam sua pesquisa sobre minorias sociais no empreendedorismo?
Keysa Mascena: A pesquisa é embasada em teorias como justiça social, empreendedorismo transicional, empreendedorismo social, empreendedorismo étnico, empreendedorismo negro, empreendedorismo feminino e estudos sobre ecossistemas empreendedores. Essas abordagens ajudam a entender como as dinâmicas de inclusão e exclusão afetam esses grupos e a identificar caminhos para a transformação social.
Portal Ciência: Que benefícios essa pesquisa pode trazer para a sociedade, especialmente para a comunidade negra e o ecossistema empreendedor como um todo
Keysa Mascena: O objetivo é criar impacto social, promovendo inclusão por meio do levantamento de processos e estratégias práticas que fortaleçam a participação de grupos minorizados nos ecossistemas empreendedores. Pretendemos também desenvolver relatórios, artigos científicos e palestras para disseminar os resultados, além de estimular ações afirmativas e a construção coletiva de espaços mais representativos.
Portal Ciência: Qual é a relação da sua pesquisa com os ecossistemas de empreendedorismo social?
Keysa Mascena: A relação é muito forte, já que muitos empreendedores de minorias têm como propósito transformar suas comunidades por meio de negócios sociais. Esses empreendimentos frequentemente estão ligados ao desenvolvimento de iniciativas de base comunitária, projetos de periferia e negócios com impacto social, que são pilares fundamentais dos ecossistemas de empreendedorismo social.
Portal Ciência: Quais métodos de pesquisa você está utilizando para conduzir o estudo?
Keysa Mascena: Estamos utilizando uma abordagem qualitativa, baseada em entrevistas com empreendedores e atores-chave dos ecossistemas de empreendedorismo, como gestores de hubs de inovação, mentores, consultores e professores. Essas entrevistas têm sido fundamentais para mapear as dinâmicas de inclusão e exclusão, além de gerar insights sobre como esses grupos percebem e interagem com os ecossistemas.
Portal Ciência: Você já identificou resultados ou insights preliminares durante a pesquisa?
Keysa Mascena: Sim, os primeiros resultados indicam que os ecossistemas empreendedores ainda são pouco representativos. Muitos empreendedores de minorias não se identificam com esses espaços e buscam iniciativas específicas, como programas de aceleração ou incubação voltados para negros ou mulheres. No entanto, esses programas têm menos recursos do que o ecossistema convencional, reforçando a necessidade de mais investimentos e ações inclusivas.
Portal Ciência: Como você acredita que esses resultados podem contribuir para políticas públicas e práticas empresariais mais inclusivas?
Keysa Mascena: Esses resultados podem fomentar discussões sobre diversidade e inclusão, orientar ações afirmativas e atrair mais esforços para criar ecossistemas empreendedores mais inclusivos. Além disso, esperamos que as práticas empresariais se tornem mais alinhadas às necessidades das minorias, fortalecendo as iniciativas que já existem e promovendo mudanças estruturais.
Portal Ciência: O que te motivou pessoalmente a estudar o empreendedorismo negro
Keysa Mascena: Minha motivação veio da minha vivência como mulher negra e da minha participação em iniciativas de empreendedorismo social. Muitas vezes, percebia que era a única ou uma das poucas pessoas negras em espaços de inovação e empreendedorismo. Isso me levou a refletir sobre a importância da representatividade e a buscar formas de contribuir para mudanças concretas. Com minha formação e recursos, encontrei na pesquisa científica uma maneira de avançar nessa pauta, promovendo conhecimento e desenvolvimento humano.
Sobre a Pesquisadora
Keysa Manuela Cunha de Mascena é Doutora e Mestre em Administração pela Universidade de São Paulo (PPGA/FEA/USP) e Bacharel em Administração pela Universidade Federal do Ceará (UFC). É professora do Programa de Pós-Graduação em Administração (PPGA) e do Centro de Ciências da Comunicação e Gestão (CCG) da Universidade de Fortaleza (UNIFOR).
Atua em pesquisas sobre gestão para stakeholders, ética nas organizações, redes organizacionais e negócios de impacto. Participa dos grupos de pesquisa Stakeholders & Networks (FEA/USP) e Núcleo de Estudos em Estratégia e Sustentabilidade (UNIFOR). É editora-chefe da Revista Ciências Administrativas (UNIFOR) e editora associada de periódicos como RAC e CONTEXTUS.