A pesquisa avaliou 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro e identificou que aqueles com maior conformidade contábil implementam mais políticas de diversidade
Nos últimos anos, os campos de futebol têm deixado de ser apenas um entretenimento esportivo para se tornarem reflexo de transformações sociais, principalmente no que diz respeito à diversidade, equidade e inclusão social (DEI). A pressão crescente por um ambiente mais diversificado tem desafiado instituições como a Fédération Internationale de Football Association (FIFA) e a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) a adotarem medidas firmes contra a discriminação e o racismo.
Em meio a esse cenário de mudanças, pesquisadores da Universidade de Fortaleza, instituição de ensino mantida pela Fundação Edson Queiroz, desenvolveram a pesquisa “Integridade Contábil e Promoção da Diversidade, Equidade e Inclusão (DEI): Evidências do Futebol de Elite do Brasil”, que avaliou como os principais clubes de elite do Brasil estão explorando a relação entre integridade contábil e prática de inclusão.
“A integridade contábil desportiva evidencia a importância da transparência e da conformidade com padrões contábeis rigorosos para garantir a sustentabilidade e a credibilidade das entidades desportivas. A promoção de ambientes diversos, inclusivos e igualitários se alinha diretamente com essas práticas, sendo essencial valorizar a diversidade nas equipes esportivas e nas instâncias de liderança” – Anna Beatriz Maia, autora da pesquisa e coordenadora do Núcleo de Apoio Fiscal (NAF)
A relação entre transparência financeira e inclusão no futebol de elite brasileiro
O estudo revela que os clubes que apresentam melhores padrões de conformidade contábil, como a divulgação de relatórios de igualdade salarial e a prestação de contas rigorosa, tendem a ser também aqueles que implementam políticas mais robustas de inclusão. O levantamento, que abrange os 20 clubes da Série A do Campeonato Brasileiro, demonstra que aqueles que se destacam por uma boa governança, como Internacional, Vasco e Grêmio, também apresentam os melhores índices de DEI.
Esses clubes adotam práticas que vão além do campo, promovendo maior representatividade racial, de gênero e orientação sexual, não só entre os jogadores, mas também nos cargos de liderança. Já por outro lado, clubes como Bragantino e Cuiabá apresentaram resultados mais tímidos em termos de inclusão.
Além disso, há um crescente entendimento de que a promoção da diversidade e inclusão também pode trazer benefícios econômicos. Clubes que adotam práticas inclusivas tendem a atrair mais patrocínios de marcas que buscam se alinhar a causas sociais, reforçando o impacto positivo da DEI em termos de visibilidade e investimentos financeiros.
A pesquisa ainda indica que apenas 35% dos clubes analisados divulgaram o Relatório de Transparência e Igualdade Salarial. Ao analisar a correlação entre integridade contábil e políticas de DEI, a pesquisa oferece um novo olhar sobre a importância de uma gestão financeira transparente para a criação de um futebol mais inclusivo e representativo.
A importância da transparência financeira para a sustentabilidade dos clubes
A transparência financeira desempenha um papel essencial na manutenção da sustentabilidade dos clubes de futebol de elite no Brasil. Ao divulgar relatórios financeiros claros e detalhados, os clubes garantem maior credibilidade e confiança junto aos torcedores, patrocinadores e demais stakeholders.
Clubes que priorizam a integridade contábil demonstram comprometimento com uma governança ética e responsável, o que, por sua vez, facilita a captação de novos investimentos e fortalece a relação com parceiros estratégicos.
No entanto, é importante reconhecer que muitos clubes ainda enfrentam desafios na implementação de práticas de inclusão e transparência financeira. Barreiras culturais e financeiras podem dificultar a adoção dessas mudanças, mas a pressão exercida por torcedores, patrocinadores e reguladores têm incentivado cada vez mais os clubes a seguirem essa direção.
Inclusão no futebol feminino
Além disso, a inclusão também deve ser observada no contexto do futebol feminino. A pesquisa ressalta que o compromisso com a diversidade não se limita ao futebol masculino, e os clubes que investem em equipes femininas demonstram um avanço significativo na construção de um ambiente mais inclusivo.
Esses investimentos contribuem para o fortalecimento do futebol feminino e refletem um compromisso mais amplo com a equidade de gênero dentro e fora dos campos.
Metodologia aplicada e resultados
Entre os dias 20 e 26 de maio de 2024, foram coletados documentos como estatutos, demonstrações financeiras, relatórios de sustentabilidade e igualdade salarial disponíveis nos sites oficiais dos clubes.
Para medir as práticas de DEI, foi desenvolvido o Índice de Diversidade, Equidade e Inclusão no Futebol (IDEIF), que consiste em um checklist de 45 itens distribuídos em quatro categorias:
- Identidade e reputação corporativa;
- Estrutura de governança, estrutura de gestão e acessibilidade;
- Comunicação.
Os resultados mostraram uma associação entre a integridade contábil e as práticas de inclusão, com clubes como Internacional, Vasco e Grêmio alcançando as melhores pontuações no IDEIF, enquanto Bragantino e Cuiabá apresentaram índices mais baixos. A pesquisa também apontou que 35% dos clubes divulgam relatórios de igualdade salarial, o que sugere uma implementação parcial dessas práticas em algumas instituições.
Para Juliana do Vale, aluna bolsista de iniciação científica que também é coautora do artigo, a partir do desenvolvimento da pesquisa, a implementação desses padrões podem aumentar a confiança de patrocinadores, torcedores e outros stakeholders.
“Esses insights podem guiar políticas que tornem a divulgação financeira obrigatória e abrangente, promovendo um ambiente de transparência e responsabilidade dentro das organizações esportivas”, finaliza a estudante.